Eu não tive uma infância feliz, uma criação saudável ou um lar harmonioso. E não estou sozinha nessa. A imensa maioria das pessoas com quem já conversei também não teve — ou ainda não consegue perceber que não teve, mas isso é conversa para outro dia.
Se eu dependesse exclusivamente do meu contexto matricial para organizar o que sei do mundo, dos outros e de mim, eu provavelmente não estaria mais aqui.
Por suas próprias questões e histórias complicadas, as pessoas que me cercaram não poderiam me ensinar sobre amor, respeito, limites, etc. Também não poderiam me ajudar a conviver melhor com meu mundo interno.
E eu entendo seus motivos, então não os culpo. Este não é um texto de ressentimento, até porque eu quase não o sinto. Estamos todos fazendo o melhor que podemos, e eu tenho plena consciência disso — inclusive mais do que gostaria de ter.
Este texto é sobre o que eu fiz para melhorar a mão de cartas que a vida me deu.
E o que eu fiz foi me cercar de pessoas.
Eu fui a criança que sempre tinha pelo menos duas amigas muito próximas. Que chamava essas amigas para dormir em casa o tempo todo ou que estava frequentemente implorando para poder dormir na casa delas.
A adolescente que passava os finais de semana na casa de amigos ou familiares, aproveitando toda e qualquer oportunidade para dormir fora ou fazendo qualquer mínima viagem a que fosse convidada.
E a jovem que arrumou um namorado com uma família nuclear receptiva, que me adotou como filha de uma forma tão profunda e sagrada que me faltam palavras para descrever.
Lembro-me de observar as dinâmicas nas casas das minhas primas desde muito nova. Lembro-me de me deitar nos colchões no chão, na hora de dormir, e ficar comparando as diferenças — para o bom e para o ruim.
Lembro-me de sentar na mesa dos adultos e fazer perguntas que os deixavam desconfortáveis. Lembro-me de ter amigos mais velhos que já tinham experimentado muito mais do mundo por terem mais anos e de aprender com eles.
Lembro-me dos pastores e pessoas a quem eu ia buscar conselho e orientação — e foram muitos. Lembro-me de comparar o que diziam com o que eu sentia, com os meus (ainda) tímidos valores, e tentar entender o que eu achava justo aplicar e o que não.
Eu buscava ativamente pelas referências de que carecia.
Com a internet ficando mais sólida e os produtores de conteúdo aparecendo, eu buscava informações sobre cada um dos problemas que experimentava. Assistia a vídeos, lia os livros que indicavam, ouvia suas participações em podcasts, aplicava o que sugeriam…
Simultaneamente, fiz mais de uma década de terapia. O que eu aprendia lá fora precisava ser processado aqui dentro, e eu, muito nova, entendi que não tinha a menor condição (e muito menos a necessidade) de assimilar minhas experiências de uma forma adequada sem ajuda.
Foram incontáveis horas dedicadas a ser uma pessoa minimamente decente, tomada pelo esforço ativo de construir para mim uma realidade qualquer coisa melhor para mim e para as pessoas com quem me relacionasse.
Hoje, aos 32 anos, tenho plena convicção de que sobrevivi porque me cerquei de pessoas.
E é esse o convite que te faço hoje: que você procure pessoas com quem possa aprender, se divertir, crescer, mudar. Pessoas que precisem da sua ajuda, dos seus conselhos e do seu sorriso. E pessoas que possam te oferecer exatamente essas coisas. (Spoiler: nem sempre você vai encontrar as duas coisas em uma só.)
Somos inerentemente sociais. Existimos porque nos relacionamos. Só faz sentido ser humano se nos mantivermos em contato com outras existências.
Aprendendo com elas, fazendo com que sejam melhores.
Quantas pessoas você tem na sua vida hoje? Vamos ampliar esse círculo?